Perdi um compromisso profissional por causa do atraso de um voo. O que a justiça do estado do Paraná diz a respeito disso?
O texto analisa uma decisão do Tribunal de Justiça do Paraná sobre atraso de voo que causou prejuízo profissional, destacando a responsabilidade solidária entre companhias aéreas, critérios para indenização por danos materiais e morais, e a proteção dos direitos do consumidor.
Alan Thiago Piske Salvador
1/6/20256 min read
Muitas são as situações incômodas e prejudiciais que podem decorrer do atraso de um voo, mas uma das mais sérias é a perda de um compromisso profissional, os quais são fonte de sustento e de cumprimento de obrigações. Tendo tal situação em mente, vamos analisar o que o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná já entendeu como solução para uma dessas situações. Os trechos a seguir são oriundos do seguinte processo: 0016832-87.2024.8.16.0021, o qual teve início no município de Cascavel/PR.
No trecho do julgado destacado abaixo, vemos um breve relato de como os fatos ocorreram no processo em questão:
“Narrou-se em inicial que, devido a um compromisso profissional, programou-se o autor para realizar uma viagem no dia 15/04/2024, saindo de Cascavel/PR com destino a Milão/IT, com conexão em Congonhas/SP, de modo que a chegada estava prevista para o dia 16/04/2024, às 10h15min. Todavia, ao chegar no aeroporto de Cascavel/PR, os requerentes foram informados de que o voo havia sido cancelado e, portanto, foram reacomodados no voo de outra companhia aérea. Porém, no momento do embarque, os autores foram novamente surpreendidos com a informação de que seus nomes não estavam na lista de passageiros e que o avião estava lotado, de forma que foram realocados em outro voo. No entanto, o novo trajeto também foi cancelado e a chegada ao destino ficou prevista apenas para o dia 17/04/2024, às 18h25min, de maneira que os requerentes perderiam dois dias de evento profissional. Assim, os autores decidiram cancelar o trajeto e não concluíram a viagem esperada, pois grande parte da conferência estava perdida. Por este motivo, postularam indenização por danos materiais e morais.”
Na porção de texto do julgado apresentada a seguir, vemos a definição de uma prática realizada pelas companhias aéreas, chamada de codeshare. O que mais importa nessa prática é que mais de uma empresa é envolvida na prestação do serviço (muitas vezes uma companhia da qual o consumidor não comprou a passagem), e esta empresa passa a ser responsável pela indenização junto da companhia original. A Justiça Paranaense entendeu que ambas as empresas se envolveram na prestação do serviço, assim como que ambas falharam, logo as duas (ou mais) são responsáveis pelos danos que o consumidor sofreu. Segue o texto expresso:
“Com relação à preliminar de ilegitimidade passiva alegada pela recorrente, verifica-se que seu pleito não merece prosperar. Isto porque, a partir da análise do documento juntado ao mov. 1.7, fica evidente a ocorrência da prática conhecida como ‘codeshare’, que, segundo a ANAC, se refere a ‘um acordo de operação comercial entre duas ou mais companhias aéreas que consiste em colocar o código de identificação de voo de uma companhia aérea em voos operados por outra companhia aérea’ (ANAC, 2022). Desta forma, embora o voo fosse operado por outra companhia, a reserva das passagens aéreas pertencia à empresa recorrente, tornando inquestionável sua participação na cadeia de consumo e, disso, gerando, consequentemente, a responsabilidade solidária pelos danos sofridos.”
Na fração de texto extraída da decisão do tribunal, vemos uma informação a respeito de uma obrigação que o autor (o consumidor prejudicado) deve cumprir, qual seja, a apresentação de comprovantes de despesas. Essa é uma obrigação que diz respeito aos danos materiais. Esse tipo de dano precisa ser demonstrado e quantificado, não podendo ser presumido. Para demonstrar e mensurar, o consumidor deve juntar e apresentar todos os documentos que comprovem gastos realizados. Conforme o texto expresso a seguir:
“No que tange aos danos materiais, observa-se que a parte autora juntou aos autos o comprovante de pagamento da hospedagem e da reserva das passagens aéreas (mov. 1.8). A respeito, entendeu o juízo de origem por conceder o reembolso dos serviços não utilizados pelos querentes. Da análise do caso, verifica-se que os autores desistiram da viagem após perceberem que chegariam ao destino com mais de 32 horas de atraso, por motivos alheios às suas vontades, o que causaria a perda de dois dias do evento profissional programado (mov. 1.21) e, por consequência, não valeria a pena realizar todo o trajeto para acompanhar apenas o final da conferência.”
Há situações em que o consumidor não tem em mãos os documentos necessários, os quais podem estar em posse da companhia aérea. Nesses casos, uma das melhores soluções é fazer um pedido no processo para que a empresa disponibilize tais documentos.
O trecho destacado do mesmo processo e decisão informa que, no caso de danos morais (que não podem ser demonstrados de forma documental, mas dizem respeito unicamente a questões emocionais e psicológicas), estes não podem ser simplesmente presumidos. É necessário que o consumidor prejudicado mostre e explique de que forma sofreu prejuízo moral. Vejamos o texto a seguir:
“Com relação aos danos morais, esta Corte Superior tem entendimento assente de que, na hipótese de atraso ou cancelamento de voos, o dano moral não é presumido em decorrência da mera demora, devendo ser comprovada, pelo passageiro, a efetiva ocorrência da lesão extrapatrimonial sofrida” (STJ - AgInt no AREsp: 2150150 SP 2022/0180443-3, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 21/05/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/06/2024). Outrossim, “a fixação do quantum indenizatório deve atender a um juízo de razoabilidade e de proporcionalidade, compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e a duração do sofrimento experimentado pela vítima” (STJ - AResp 1821790/GO, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 14/02/2023).
Muitas vezes, tais danos não são apresentados de forma documental, mas sim por meio de argumentação e narração de fatos.
No caso em tela, a decisão judicial esclarece as razões pelas quais os sofrimentos experimentados pelos consumidores não se trataram apenas de um descontentamento corriqueiro, mas foram algo além. Vejamos o texto que segue:
“Infere-se dos autos que os autores perderam compromisso profissional e a hospedagem agendada devido à falha na prestação de serviços da companhia aérea. Também é possível identificar que enfrentaram momentos de desconforto e inquietação durante o período em que estiveram aos cuidados da empresa, tendo em vista que, além da previsão de atraso de 32 horas para chegada ao destino, os requerentes tiveram as expectativas frustradas por três cancelamentos seguidos de voos e realocações que não deram certo (mov. 1.7, 1.11 e 1.14). Diante desse conjunto de fatos e provas, tem-se que os transtornos por eles vivenciados superam o mero aborrecimento do cotidiano, excedendo os limites do imprevisto, do mero dissabor do cotidiano, comprometendo, enfim, o equilíbrio psicológico, restando configurado o abalo moral. Isso considerado, não se afigura excessiva a verba indenizatória concedida a título de danos morais pelo juízo singular (R$ 4.000,00) a cada um dos autores.”
O texto da decisão judicial narra a perda do compromisso importante para a profissão dos consumidores, assim como as hospedagens já pagas, ambas as perdas decorrentes da falha na prestação do serviço. O texto fala ainda que os consumidores foram expostos a desconforto e inquietação enquanto sob os cuidados das empresas de transporte aéreo. É visto, ainda, no texto que os consumidores tiveram de suportar um atraso de 32 (trinta e duas) horas e 3 (três) cancelamentos seguidos, bem como realocações ineficientes.
Segundo a Justiça do Paraná, tais situações superam um simples incômodo, e as empresas foram condenadas ao pagamento do valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) para fins de indenização por danos morais. Esse valor é além do reembolso dos valores já gastos pelos consumidores em passagens, hospedagens, etc.
Diante do exposto, é visível que a Justiça do Paraná tem apresentado entendimentos que colocam em segurança os interesses dos consumidores prejudicados por atrasos de voos, especialmente em situações que causam prejuízos profissionais.
Caso você tenha passado por alguma situação semelhante, sinta-se à vontade para entrar em contato. Os advogados do escritório usarão todas as ferramentas e meios possíveis para buscar uma justa reparação pelos prejuízos causados.
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